Hipóteses de aborto legitimado
(aborto legal)
Art.
128 - Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto
necessário
I
- se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto
no caso de gravidez resultante de estupro
II
- se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante
ou, quando incapaz, de seu representante legal.
1.1. –
A hipótese de aborto necessário (inciso I do artigo 128 do Código Penal) se
enquadraria no artigo 24 do Código Penal, pelo sacrifício de um bem jurídico (a
vida intrauterina) para o salvamento de outro (a vida da gestante). Mesmo
assim, o legislador entendeu por discipliná-lo na Parte Especial do Código
Penal, que se difere da excludente de ilicitude da Parte Geral por não exigir aqui
a existência de perigo atual ao bem jurídico que se quer salvar.
1.2. –
O aborto em vítima de estupro, por seu turno, depende de prévio consentimento dela
ou, enquanto incapaz, de seu representante legal. A doutrina designa essa
excludente como aborto humanitário, ético ou sentimental, por permitir que a
vítima de estupro aborte ser concebido de modo indesejado, violento. Não lhe
impõe, assim, a obrigação de aceitar a concepção advinda da violência que
sofreu.
Não
há exigência de se reconhecer judicialmente a prática do crime de estupro. Contudo, alguma cautela se impõe antes de se admitir o aborto nessas
circunstâncias.
O
aborto necessário e o humanitário são considerados pela doutrina como
excludentes da ilicitude, embora a redação da norma dê a entender que se trata
de excludente da punibilidade, ao empregar no artigo 127 do Código penal a
expressão “Não se pune...”.
1.3. –
O Aborto eugênico não está previsto em lei, sendo, contudo, reconhecido como
legítimo pela doutrina e jurisprudência, ocorrendo quando demonstrada a inviabilidade da vida do nascituro fora do útero, em razão
de anomalias, malformações e/ou doenças:
HABEAS CORPUS INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ
– FETO PORTADOR DE SÍNDROME DE EDWARDS – VIDA EXTRAUTERINA INVIÁVEL – RISCO EMINENTE
À GESTANTE – MANUTENÇÃO DA GESTAÇÃO QUE PODE CAUSAR GRANDES TRANSTORNOS À SAÚDE
FÍSICA E EMOCIONAL – ATENÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA HUMANA ORDEM CONCEDIDA.
(TJSP, Habeas Corpus n.º0210254-34.2012.8.26.0000, 6.ª Câmara Criminal,
Rel. Marco Antônio Marques da Silva, j. em 27/09/2012).
APELAÇÃO. PEDIDO DE INTERRUPÇÃO DE GESTAÇÃO. FETO ANENCÉFALO E COM MÚLTIPLAS
MAL-FORMAÇÕES CONGÊNITAS. INVIABILIDADE DE VIDA EXTRA-UTERINA COMPROVADA POR
EXAMES MÉDICOS. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. APLICAÇÃO DO
ARTIGO 128, I, DO CÓDIGO PENAL, POR ANALOGIA IN BONAM PARTEM. Comprovadas por variados exames médicos a
anencefalia e as múltiplas mal-formações congênitas do feto, de modo a tornar
certa a inviabilidade de vida extra-uterina do nascituro, é possível a
interrupção da gestação com base no Princípio constitucional da Dignidade da
Pessoa Humana e, por analogia in bonam partem, no artigo 128, I, do Código
Penal. (...). O aborto eugênico,
embora não autorizado expressamente pelo Código Penal, pode ser judicialmente
permitido nas hipóteses em que comprovada a inviabilidade da vida extra-uterina,
independente de risco de morte da gestante, pois também a sua saúde psíquica é
tutelada pelo ordenamento jurídico. A imposição de uma gestação comprovadamente
inviável constitui tratamento desumano e cruel à gestante. 3. Parecer
favorável do Ministério Público, nas duas instâncias. RECURSO PROVIDO. (TJRGS, Apelação
Crime nº 70040663163, 3.ª Câmara Criminal, Relator: Nereu José Giacomolli, j.
em 30/12/2010).
Tal decisão, contudo, trata-se apenas de um precedente jurisprudencial, sem efeito vinculante.
Aborto do Anencéfalo (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54)
No julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54 (ADPF nº 54), compreendeu o pleno do Supremo Tribunal Federal pela atipicidade do crime de aborto quando da interrupção da gravidez do embrião anencéfalo, sem margem a ampliação do entendimento a outras doenças congênitas, sob o fundamento da inviabilidade do desenvolvimento do feto, assim como da vida extrauterina, dentre outras razões.
Aborto até o terceiro mês de gestação (Habeas Corpus nº 124.306-RJ – STF)
No julgamento do Habeas Corpus nº 124.306/RJ, admitiu-se a concessão da liberdade nos casos de crime de aborto, compreendendo-se pela atipicidade da manobra abortiva até o terceiro mês de gravidez, independentemente da viabilidade da sobrevida do embrião, não se tratando, assim, de conduta criminosa.
Isso sob os fundamentos dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher, sua autonomia, integridade física e psíquica, tal como a própria igualdade em relação ao homem. Com destaque a estes fundamentos, entre outros de aspecto processual e formal, o Ministro Luís Roberto Barroso justificou seu voto pela concessão da ordem.
Tal decisão, contudo, trata-se apenas de um precedente jurisprudencial, sem efeito vinculante.
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